Após ler o texto do teólogo Dr. Frei Antonio e, depois de muito ouvir e pesquisar sobre o recente escândalo na área de medicina reprodutiva, achei que deveria expor minha opinião como alguém que há muitos anos se dedica ao trabalho na área.
A especialidade, que abrange o tratamento da infertilidade conjugal em todas as formas de manifestação, está em pleno crescimento e desenvolvimento por todo o mundo. Não se mostra com sombras, mas, ainda, com muitas interrogações. Existem diversos profissionais envolvidos em pesquisa de ponta e esforços não são poupados para atingir os melhores resultados.
Todos os casais têm direito a desejar um filho. O corpo feminino, mensalmente, se prepara para a concepção e tem sua anatomia desenhada para gravidez e parto. Mas a humanidade vem criando condições cada vez piores para a fertilidade. Inventamos o agrotóxico, poluímos a água que consumimos e o ar que respiramos. Com a vida moderna, a mulher também passou a ter mais opções para escolher o momento da gravidez, muitas vezes priorizando a vida profissional e financeira. Por tudo isso, a procura pelas clinicas de tratamento da fertilidade vem aumentando substancialmente.
Os procedimentos envolvem alto padrão científico e tecnologia avançada, necessitando de pessoas capacitadas e bem preparadas para lidar, não só com a questão médica, como também com o aspecto psicológico que a situação exige. Para a maioria desses profissionais, a ética é prioridade e o respeito ao paciente, fundamental.
Os procedimentos investigados nesse episódio, da maneira e com a finalidade que se supõe, não são difundidos em outras clínicas do Brasil ou do mundo. Não existe respaldo científico para tais métodos.
A comunidade científica pode e deve debater questões éticas tais como quando a vida começa: a partir do embrião que está no laboratório, ou do batimento cardíaco na vida intrauterina. Podemos discutir sobre a união de casais homoafetivos e o direito sobre a formação da família. Podemos discutir também sobre o congelamento e o destino desses embriões.
Contudo, as denúncias específicas que envolvem o episódio precisam ser discutidas de forma particular e no âmbito judicial. É preciso muito critério para que essas acusações não passem a resvalar nos demais profissionais da área. Não se pode julgar todos por um.
Como acontece em qualquer especialidade, o paciente tem que ter critérios quando opta pelo médico que vai atendê-lo. A ética e o respeito ao ser humano fazem parte da vida e da formação de todos os profissionais, sejam eles médicos, engenheiros, advogados ou professores.
Uma legislação mais específica, que regulamente o serviço de reprodução humana assistida, é certamente benvinda. Todas as questões éticas devem ser plenamente debatidas dentro de um conselho de bioética e, uma vez legisladas, precisam ser rigorosamente fiscalizadas. Esse cuidado é o que garantirá seu cumprimento à risca no futuro, dando cada vez mais segurança aos pacientes, o que, no final das contas é nosso principal dever como médicos.
Dra. Maria Cecília Erthal
Médica ginecologista e especialista em reprodução humana assistida